Os ingredients da época: Outono

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As folhas caem e as abóboras amadurecem, assim nos surge o Outono deste lado do hemisfério. E com o Outono chega-nos a altura de comidas quentes, e sabores redondos. Abaixo descrevemos a nossa lista com os melhores ingredientes da estação, e sugestões para combinações perfeitas.

Abóbora

Esqueçamos o Halloween, queremos mais abóboras na nossa vida. Temos a boa fortuna de Portugal ser um bom país para a cultura de abóboras, e as abóboras estão enraizadas na nossa gastronomia. Quem pensa em abóbora lembra-se da sopa, das filhós, dos sonhos, da compota, do pão, dos assados. Assim sendo só falta escolher: abóbora-cheirosa (Cucurbita moschata),  abóbora-carneira (Lagenaria siceraria), abóbora chila (ou gila) (Cucurbita ficifolia), abóbora-menina (Cucurbita maxima), abóbora porqueira ou abobrinha (Cucurbita pepo). Quanto mais pequena a abóbora, mais concentrado é o seu sabor e menos aguada a sua consistência. Ah! E as sementes também se comem: depois de lavadas, podem tostar-se no forno com um pouco de sal.

Abóbora combina com:

Carnes: bacon, porco e marisco
Lacticínios: queijo de cabra e queijo azul
Frutos frescos & secos: maçã, lima, amêndoas e castanhas
Vegetais & fungos: cogumelos
Especiarias e ervas: alecrim, noz-moscada, salva, gengibre, canela e chili

Cogumelos

A humidade do Outono traz-nos uma multiplicidade de cogumelos selvagens, e é uma oportunidade que não podemos perder. Claro que não recomendamos a ninguém a apanha de cogumelos selvagens, que deve ser feita apenas por profissionais ou amadores altamente experientes devido ao sério risco de envenenamento (não queremos morrer, pois não?). No entanto, algumas destas maravilhas podem ser encontradas em mercearias e lojas especializadas por esta altura do ano, tal como é o caso do míscaro amarelo (Tricholoma equestre), os cantarelos (Cantharellus cibarius), os boletos (Boletus edulis, Boletus granulatus, Boletus scaber), os lepiotas (Lepiota procera) ou os agáricos (ex. Agaricus arvensis, Agaricus sylvaticus), entre outros.

Cogumelos combinam com:

Carnes, peixes & mariscos: vaca, porco, bacon, frango, ovos, ostras, peixes gordos e brancos
Lacticínios: manteiga, natas, queijo azul, queijo de cabra, queijos curados e amanteigados
Frutos frescos & secos: alperces, tomate, mirtilos, castanhas e nozes
Vegetais & fungos: alho, cebola, espargos, abóboras, batatas e trufas
Especiarias e ervas: anis, funcho, hortelã, alecrim e tomilho

Dióspiro

O asiático dióspiro (Diospyros kaki) é um fruto de maravilha, que tanto nos deslumbra como nos destrói. Ninguém é capaz de se esquecer da experiência de comer um dióspiro pouco maduro (depende da variedade, é facto). É sem dúvida difícil de esquecer tão adstringentes taninos, que são como lixa na nossa língua. Mas um dióspiro maduro é algo que poucos frutos igualam em doçura e delicadeza. É importante, assim sendo, saber escolher bem um dióspiro: procura-se uma consistência francamente mole, sem grandes manchas pretas ou acastanhadas. Depois, ou se come assim, ou se foge com ele para o mundo da pastelaria e doçaria, para compotas, bolos, tartes e afins.

Diospíro combina com:

Lacticínios: queijo de cabra, queijo creme, gelado e iogurte
Frutos frescos & secos: banana, maçã, figo, laranja, amêndoa e nozes
Vegetais: rúcula, espinafres, batata doce e couves
Especiarias, ervas & outros: pimenta preta, açúcar mascavado, gengibre e chocolate

Couves

A couve original, Brassica olearacea, cultivou-se há mais de 8.000 anos. Ao longo do tempo e da selecção pela mão do Homem, originou um vasto leque de variedades de couve que bem conhecemos, como o bróculo, a penca, o repolho, a couve-flor, a couve-galega a couve-de-Bruxelas, entre outras. A couve-galega (Brassica oleracea var. Acephala) é uma das mais amadas em Portugal, ou não fossemos tão parciais a um bom caldo verde.

Que o frio faz boas couves, é sabido. Assim sendo, nesta altura do ano celebramos com sopas, arrozes, cozidos e salteados. Genericamente, para escolher as melhores couves, escolha as que têm folhas pequenas, que serão mais tenras e saborosas.

Couves combinam com:

Carne & peixe: borrego, vaca, porco, bacon, frango, peixes fumados e ovos
Lacticínios: queijo azul
Frutos frescos & secos: maçã e castanhas
Vegetais & fungos: cebola, alho, batatas, cenoura e trufas
Especiarias e ervas: noz-moscada, zimbro, gengibre e chili

Maçã

Hoje em dia é fácil esquecer que as maçãs (Malus domestica) são um produto sazonal, visto que nunca desaparecem das bancas de fruta. De facto, muitas variedades de maçã estão agora na sua fase mais deliciosa. É verdade: há muito para dizer do sabor das maçãs, pois nas suas muitas variedades desenha-se uma escala que varia entre o muito doce e o extremamente ácido, do sensaborão ao floral e quase tropical. Dentro das maçãs portuguesas, procuremos então as variedades Casa Nova, Porta da Loja, Verdeal, Riscadinha de Palmela e Bravo de Esmolfe. As variedades estrangeiras Granny Smith e Fuji estão também na sua melhor forma. Para as conservar da melhor forma antes de as comer cruas ou cozinhar, opte por embrulhar maçãs intactas (sem pisaduras ou defeitos) em folhas de jornal, e armazená-las num local fresco, dentro de um cesto.

Maçã combina com:

Carne & peixe: porco, bacon, fígado e morcela
Lacticínios: queijos curados e amanteigados
Frutos frescos & secos: mirtilos, amoras, pêras, laranjas, ananás, nozes, amêndoas, amendoins e avelãs
Vegetais: aipo, cenouras, abóboras, rábano, beterrabas e couves
Especiarias e ervas: canela, sálvia, baunilha, cravo-da-Índia e anis

Marmelo

Não há queijo que não mereça uma marmelada, mas para isso tem de haver marmelos. Pois é, preparem os tachos de cobre porque os marmelos estão aí. Sendo familiar próximo da pêra, o marmelo partilha o mesmo perfil de sabores, mas presenteia-nos com um aroma mais floral e até tropical. Os seus notórios taninos conferem-lhe um sabor ligeiramente azedo, que traz ao marmelo uma clara distinção da pêra, mas uma excelente combinação com salgados.  Desde a Idade Média que o marmelo (Cydonia oblonga) faz parte do quintal português, e desde então que se aprimoraram as múltiplas receitas caseiras de marmelada, que se dividem entre a marmelada branca e na marmelada vermelha, a mais comum. Falta também referir a maravilhosa geleia de marmelo (a minha favorita). O marmelo também se presta bem para bolos, tartes, saladas quentes e assados. Pode amadurecer os marmelos em sacos de papel perfurados, depois de maduros conserve-os no frigorífico.

Marmelo combina com:

Carne & peixe: carnes curadas/fumadas (marmelada)
Lacticínios: queijos curados, meia-cura e amanteigados
Frutos frescos & secos: tomate, líchia, banana, ananás, maçã e pêra
Vegetais: aipo, cenouras, abóboras, rábano, beterrabas e couves
Especiarias, ervas e outros: chá preto, mel, vinho doce e vinho tinto

Romã

A romãzeira (Punica granatum) traz-nos a romã, um luxuoso e complicado fruto outonal. Escolher romãs não é complexo, basta escolher aquelas com maior peso, sem manchas na casca, que deve ser vermelha. O segredo está em esquartejar a romã e remover as sementes aquando mergulhado o fruto em água, só basta coar e as sementes cor de rubi ficam prontas para comer. Se quiser, pode ainda colocar as sementes no processador de comida e passado alguns momentos, voilá, tem sumo (já agora, vale a pena coar no fim). As sementes da romã, no seu equilíbrio entre a doçura, amargura e acidez, prestam-se a todo o tipo de pastelaria, mas também para acompanhar pratos e carne e guarnecer saladas. E convém não esquecer que a romã é extremamente rica em antioxidantes, portanto ainda tem um benefício acrescido.

Romã combina com:

Carne & peixe: vaca, sardinha e cavala
Lacticínios: queijos curados
Frutos frescos & secos: maçã, tomate, manga, mirtilos, côco, azeitonas e nozes
Vegetais: favas, couve galega e espinafres
Especiarias, ervas e outros: chocolate, lúcia-lima, pimenta preta e canela

Pêra

Apesar de se comerem pêras todo o ano, é no final do Verão e pelo Outono que muitas variedades se apresentam em todo o seu esplendor. Basta assim falar, para quem conseguir encontrar, das variedades nacionais Melão, Deliciosa da Beira, Cristo, Pêra do Cardeira, São Bento de Chaves, entre outras, que desde os finais de Setembro se encontram numa madura suculência. Trate de comprar pêras com o nível certo de amadurecimento, apesar de as pêras poderem ser facilmente amadurecidas em casa: basta colocá-las num saco de papel perfurado e deixá-las à temperatura ambiente, mas com o cuidado de não as deixar amadurecer demais. As pêras rapidamente perdem a consistência ideal, ficando farinhentas. E agora, o que fazer com elas? Para além da pêra fresca, podemos imaginá-la bêbeda (com Vinho do Porto, por exemplo), em calda, como uma aguardente ou sidra, em compota, numa tarte, num bolo, com chocolate derretido. Quer melhor?

Pêra combina com:

Carne: porco, presunto, vaca e frango
Lacticínios: queijo de cabra, queijo azul e queijo curado
Frutos frescos & secos: bananas, castanhas, avelãs, nozes e amêndoas
Especiarias, ervas e outros: canela, cardamomo, anis, chocolate, vinho tinto e vinho do Porto

Salsifis

By martinlehnberg from Flickr, CC BY-ND 2.0
By martinlehnberg from Flickr, CC BY-ND 2.0

Eis que surge o ingrediente mais incomum da lista, o salsifis. Esta estranha e tubular raíz é primo do dente-de-leão, esse campeão das saladas de primaveris. Existe a variedade branca (Tragopogon porrifolius) e a variedade negra (Scorzonera hispanica). O sabor de ambos é semelhante, mas a variedade negra é mais carnuda, menos fibrosa e com um paladar que relembra frutos secos. Há quem descreva até o sabor como um híbrido entre um aipo e uma alcachofra, mas por outro lado, também lhe é reconhecido um distinto sabor a ostra. Ao contrário do que se espera, o salsifis (especialmente a variedade negra) não está ausente da história da culinária portuguesa, sendo encontrado em várias receitas do século XVII ao século XX, onde é conhecido como escorcioneira. O doce de escorcioneira, tradicional de Évora, perdeu-se no tempo há mais de 50 anos, talvez devido à mudança das práticas agrícolas (e dos gostos). O doce consiste num rebuçado de salsifis cristalizado embrulhado em papel. Mas nem tudo parece estar perdido, há quem faça esforços para recuperar o cultivo da escorcioneira e a manufactura do doce, tendo até sido nomeado e aceite no Ark of Taste.

Salsifis combina com:

Carne, peixe & marisco: frango, presunto, foie gras, salmão e ostras
Lacticínios: mozzarella de búfala e manteiga
Fruta: tomate, líchia, alperce e framboesa
Vegetais & fungos: espargos e cogumelos
Especiarias e ervas: chá preto, basílico, mostarda, aneto e anis

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